(POR) O jornal Observador foi ao circo com a apresentadora Trudy e o palhaço Barry: quem diz que este não é o maior espectáculo do mundo?
"Em 1975, o Herby foi convidado para organizar o Circo do Coliseu e desde então vive em digressão eterna pelos circos europeus, onde recruta os artistas que depois traz a Lisboa todos os Natais. Diz-me que já não faz magia porque os dedos engrossados pelos anos não permitem que tal ilusão aconteça. Enquanto esperamos que as portas do Coliseu se abram, mostra-me ainda fotografias do primeiro circo que organizou, em que trouxe a companhia inteira do Circo de Moscovo (o melhor que já viu), que integrava então vinte e dois elefantes, que, como vejo no seu arquivo, vieram em procissão até aos Restauradores, desde Santa Apolónia, onde chegaram através de um comboio especial.
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Para o Herby, percebo agora, o circo é a memória mágica e melancólica de uma juventude perdida. Senta-se então num banco e chama à conversa o Fredy Castanheira, um trapezista já reformado, filho de um palhaço e de uma equilibrista, irmão de uma contorcionista e pai de trapezistas, malabaristas e de motociclistas da roda da morte. A mulher, Trudy Nery, fazia malabarismos com bicicletas e é agora apresentadora do Circo do Coliseu. O Fredy fala-me com saudades da vida de estrada, da mania de batizar os filhos com nomes tradicionais dos sítios onde estes nasciam e até parece sentir saudades das quedas, cujas cicatrizes me mostra com orgulho. Ao vê-lo assim sorrir como se estivesse no cimo de um trapézio, ecoam na minha cabeça os versos de um poema do Philip Larkin acerca da admiração que sentimos em relação àqueles que um dia, sem grande motivo, pegam na sua trouxa e se fazem à estrada (“We all hate home/ And having to be there”) e penso se a casa do poema não será para o Fredy a sua reforma e se o ódio de que aqui se fala não será outra maneira de amar. Mas adiante."